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quarta-feira, 17 de dezembro de 2008
PELA DEGOLA DOS CARTOLAS DA "CULTURA"
PELA DEGOLA DOS CARTOLAS DA "CULTURA"
(Carlos Henrique Machado Freitas)
Cultura e Mercado
Com a perspectiva de novos horizontes para um modelo de mercado
cultural auto-sustentá vel, suscitam novas teorias obrigatórias,
lógico. Mas as perguntas continuam, isso significa a quebra de
paradigmas? Teremos uma nova lógica nas relações comerciais entre
arte e mercado? Essas perguntas terão que ser feitas. Vou ainda mais
longe, tivemos mesmo um mercado de arte livre? Creio que não. O que
podemos classificar como mercado cultural, não necessariamente está
associado a música, teatro, cinema e etc. Esse mercado vem
acompanhado de uma série de exigências de conteúdo, planos, metas,
público alvo, mercado por mercado, bem ao modelo de quem vende
sabonete, creme dental, utensílhos domésticos e bugigangas
eletrônicas. Não que tenhamos que tratar a arte na dimensão
excessivamente espiritual, como se o artista fosse um guru intocável,
mas convenhamos, os moldes quase caricatos de uma arte conceitual via
academismo e o top pop via fábrica do barato entretenimento do "bumbo
do Zé Pereira yup, from Brazil", também é um tanto quanto indigesto.
Não que a arte não interaja com a sociedade, ela é um organismo vivo
e, naturalmente refletirá o seu cotidiano. E a economia é fator
fundamental para a organização da sociedade. Portanto, a economia tem
relevância fundamental no desenvolvimento da obra de um artista.
No entanto, isso passa a léguas de distância dos desserviços
financistas de mercadores afoitos por vender qualquer coisa que,
aliás, andam a impregnar ambientes de um promissor mercado de cultura
via Lei de incentivo, com as suas lógicas de arrecadação de recursos
fartos e fáceis, com suas práticas pouco honestas que caminham entre
os gabinetes de políticos e os departamentos de marketing,
deslumbrados com algum ativo midiático oferecendo produto de
exposição tanto político quanto institucional para o marketing
empresarial.
A arte, o artista, na realidade, não conhecem a tal liberdade quando
se fala de mercado. Há um certo vício em ajeitar a prateleira, a
vitrine para atrair a freguesia. No fundo, há um certo lápis na
orelha do mercador pronto a fazer contas em cima de um embrulho de
pão e, com isso, asfixiar a liberdade criativa, destruindo
naturalmente a ponte entre a sociedade e o arte.
Mesmo clean, de bons modos ensaiados, o interlocutor nos cobra
obediência, até quando nos pede para sermos rebeldes, desses
fabricados em pré-lançamentos de seus produtos. Neste momento em que
o artista participa dessa ópera dos horrores, a sua arte passa a ser
um chiclete, um pirulito, uma língua de sogra que ele sopra contra os
seus peóprios sentimentos, aqueles guardados em suas utópias.
Quando uma química que tudo indica construirá nas próximas décadas
entre Estado, mercado e artista, não estabelecem regras definidas de
seus papéis independentes, assistiremos a uma micelância
carnavalesca, ao samba do branco doido, ao mercado de cultura para
inglês ver, bem próprio desse sururu que mistura conceituação culta
com trampolins midiáticos para se chegar a um certo dumping e
formatar a griff, está pronto o produto para ser consumido pela
opressão, pela imposição, seja pelo mundão dos cultos, seja pelo
mundo cão, que no final serão faces diferentes de uma mesma moeda,
uma moeda impávida que nem está aí para a responsabilidade com o
mercado cultural, está hoje vendendo arte como poderia estar vendendo
penico, com o seu uso restrito de um urinório.
Tenho assistido embasbacado a invasão da manada caça-níquel a avançar
sobre os recursos das leis de incentivo nas três esferas do
executivo, ou seja, o mesmo agente, neotudo pela grana, veio
literalmente com aquela gana de fazer barba, cabelo e bigode e não
deixar pedra sobre pedra. Este bombástico empresário que está
faminto, meio no desespero por ter perdido a condição de Dom King
pela quebra do grande mercado internacional, anda agora a se reunir
com cúpulas artístico/empresaria is para atacar os cofres públicos.
Munido do conhecido pragmatismo em prever o passado, este esperto
corre atrás da grande estrela para que não haja qualquer dúvida sobre
o seu investimento, então, recebe o start imediato do artista que há
muito abandonou a arte pelo primeiro sabor de um flash bem remunerado
e que ainda o expõe para o seu público preferido, o burguês sentido
aristocracia. Esse é o mercado bonachão, charuto e chapéu copa norte,
terno risca de giz, máfias das mais ferozes, gente que tramita bem
nas grandes associações comerciais e não vai deixar a bola quicando
na pequena área sem fazer o gol de placa afortunado. Esse artilheiro
preguiçoso está ali na pequena área, não volta pra ajudar a defesa.
Gordo, pesado, mas vivido no mundo da cartolagem, conhece bem os
atalhos para construir as suas novas fontes de arrecadação e só fazer
gols decisivos.
Há de se ter uma idéia bastante clara sobre as leis de incentivo, o
porquê da sua criação, seria para proteger milionários que se
esbaldaram com os slogans da moda, ao estilo sexo, droga e rock and
roll, para se fartarem do mercado numa rebeldia teen típica da
juventude média consumista, que são alvo dos produtos bancários já na
porta das universidades?
O capital é flexível, digamos, excessivamente flexível, tanto que não
tem pátria, tanto que cobra uma cultura sem pátria com o discurso
virtual universalesco, obreiro nas fortunas particulares, seja aonde
for. O artista que não resistir a essa tentação vira produto desse
roda-moinho, dessa roda-viva que o segregou e que motivou outros
tantos a cobrar responsabilidade do Estado em apoio aos que
resistiram à manada migratória rumo a Disneylândia. Não será agora
que, em nome de uma certa democracia cultural, o governo vai permitir
o abrigo estatal dessa vergonhosa prática de mercado, que pode ser
tudo, menos cultural.
Imagino eu que a arte seja um daqueles instantes em que o ser humano
concebe a vida, daqueles momentos de extremo cuidado com o ser alí no
seu nascedouro, na forma como foi nutrido, alimentado, isolado para
que todas as garantias de sua sobrevivência diante do meio fossem lhe
dadas.
O Ministério tem a responsabilidade de proteger este ambiente,
fortalecer esse aspecto da sociedade, ter a sensibilidade e coragem
suficientes para barrar esses forasteiros, espertalhões que andam
agora a cavar, ou melhor, a agiotar a arte tomando lugar de gestores,
produtores sérios e artistas comprometidos em construir um mercado
responsável, pensamento que pode ser extremamente virtuoso se tocado
com a devida responsabilidade. Esse mercantilismo que anda à solta
captando recursos que originalmente seriam para o financiamento da
resistência e mudança de paradigmas, tem que ser detectado e
imediamente debelado em sua fonte para que não irrigue mais e não
mais contamine tanto o balcão politico quanto os departamentos de
marketing, senão, as leis de incentivo serão a fogueira migratória
com cem por cento de chance de dar certo, de um mercantilismo que
agora nem investimento primário precisam ter para se afortunar com os
retornos. Com as leis e seus opulentos recursos concedidos a esses
cartolas, o pacote já vem pronto e com zero por cento de risco no seu
investimento. E mais uma vez frustrar um possível ambiente salutar no
campo da cultura.
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