Escrito por André Barrocal l Carta Maior
Ministro da Fazenda diz que governo tem 60% da ex-estatal e que empresa deve "contribuir" com os "interesses do país"
O governo Dilma Rousseff decidiu enfrentar certos interesses empresariais valendo-se de um amplo apoio político no Congresso que garante, em tese, que o descontentamento não vire crise. Os contrariados podem recorrer a rivais do PT, para tentar desestabilizar o governo e, assim, preservar os interesses, mas os parceiros estão frágeis e desarticulados, para que a dobradinha seja vitoriosa. Um exemplo? A troca no comando da Companhia Vale do Rio Doce. A oposição a Dilma só conseguiu produzir notícia com o objetivo de desgastar o governo diante de um fato consumado. E sem empolgar multidões.
Condutor do processo que levou à recente substituição de Roger Agnelli da presidência da Vale, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, foi ao Senado, nesta terça-feira (03/05), debater inflação e “o caso Vale”. A inclusão da mineradora na pauta da audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) foi um pedido de dois senadores do PSDB, Álvaro Dias (PR) e Cyro Miranda (GO). Questionado se falara com Agnelli ou algum emissário dele antes de chamar Mantega, Dias disse que não. Segundo ele, há “notícias de ingerência política do governo em empresas há muito tempo”, e era necessário trazer o assunto a público.
O que os adversários do governo chamam de “ingerência política” em empresa privada, o ministro classificou como uma “relação saudável”. Para Mantega, não se pode esquecer que o governo tem 60% do controle acionário da Vale, por meio do Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e da Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, que é estatal. Portanto, o governo teria obrigação e direito de participar dos rumos da Vale, a segunda maior empresa do Brasil, atrás apenas da Petrobras.
O ministro, que negociou a troca de Agnelli com o Bradesco, maior acionista privado da Vale, disse que nenhuma mineradora do mundo teve um presidente por tanto tempo - Agnelli comandou a Vale por dez anos -, e uma mudança agora é “absolutamente normal”.
Mais importante, porém, na opinião do governo, a motivar os passos de Mantega, sempre respaldados pela presidenta Dilma, é que a Vale tivesse uma direção que levasse em conta os interesses do país. Não seria o caso de Agnelli, cujo desgaste perante o Palácio do Planalto vem desde a gestão Lula. No início da crise financeira mundial de 2008, a Vale demitiu milhares de trabalhadores quando o governo buscava convencer a sociedade de que o pessimismo pioraria as coisas.
O atraso na construção de fábricas produtoras de aço era algo que exasperava o ex-presidente Lula. Ele acreditava que a empresa não podia apenas “esburacar” o Brasil para exportar minério de ferro. A Vale deveria abrir siderúrgicas, gerando empregos e riqueza. Dilma pensa igual. “A Vale tem que contribuir, sim, com os interesses do país”, afirmou Guido.
PSDB versus PSOL
Para o PSDB, contudo, a gestão de Agnelli já atendia os interesses nacionais. Na audiência pública, Cyro Miranda listou dados positivos da empresa para mostrar como a privatização da Vale, no governo Fernando Henrique, teria sido favorável ao Brasil, não só à empresa. No ano passado, a Vale teve lucro, faturamento e número de trabalhadores recordes. De 2000 a 2010, comprou 16 companhias pelo mundo e aportou na China e na África. E nunca pagou tantos impostos quanto agora. “A administração privada foi determinante para estes resultados”, disse Miranda, para quem a ação do governo foi “afrontosa”.
Como os adversários do PT são poucos no Congresso, num debate em que mais de vinte senadores se manifestaram, apenas mais um, fora os dois tucanos, tocou no assunto. Foi a senadora Marinor Brito (PSOL-PA). Que, por pertencer a um partido à esquerda de PSDB e PT, entrou na discussão para criticar os dois lados.
Ela acredita que o governo fez certo ao interferir na Vale, pois tem o controle acionário da empresa. Mas acha que os objetivos estão errados. O governo não deveria, por exemplo, articular a entrada da Vale num projeto como o da construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. Para a senadora e o partido dela, a usina é um atentado contra o meio ambiente e vai acabar com comunidades indígenas da região. “Essa usina vai beneficiar grandes empresas exportadoras, não o povo brasileiro”, afirmou Marinor.
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